Nascida em Trindade, cidade na região metropolitana de Goiânia formada em torno de relatos milagreiros, Miriam Inez da Silva teve em sua infância o berço de suas referências estéticas que posteriormente foram recorrentes em suas obras, entre elementos eclesiásticos e de caráter mitológico. Em 1960 Miriam muda-se para o Rio de Janeiro, assim como boa parte do contingente populacional do centro-oeste e do nordeste brasileiro que compuseram um grande fluxo migratório rumo ao sudeste. Na capital carioca, a artista dá continuidade a sua formação nos estudos de Belas Artes que havia iniciado em Goiás, aprofundando seus conhecimentos em xilogravura no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, tendo como professor o artista concreto Ivan Serpa.
Com suas gravuras, Miriam participa de duas edições da Bienal de São Paulo (1962 e 1964), duas edições da Bienal da Bahia (1966 e 1968) e uma da Bienal de Gravura de Santiago (1969). Gradualmente a artista deixa de trabalhar com esta linguagem, e de 1970 em diante passa se dedicar quase que exclusivamente à pintura. Neste período, temas mais ligados à cultura urbana carioca passam a compor o repertório de Miriam, como a boemia, ícones da música popular, a dramaticidade e manifestações políticas. Além das recorrentes cenas carnavalescas, de escolas de samba, também são retratados aspectos domésticos e familiares, de caráter mais intimista. Tendo como suporte tábuas de madeira recortadas, as pinturas da artista apresentam um elemento geométrico comum: suas bordas coloridas. Geralmente em tons terrosos, as bordas emulam uma moldura e oferecem um espaço interno de fundo branco, onde figuram seus personagens em ação.
Comumente apresentada sob uma crítica que trata sua obra como ingênua, intuitiva, simples e primitiva, Miriam tem um repertório complexo, que não se esgota no que foi estabelecido dentro dos limites de uma suposta “arte popular”. Sua obra, em verdade, ressalta suas intenções, malícias e transgressões, evidenciando que a artista era uma observadora atenta das pessoas, da sociedade brasileira e das micropolíticas do tecido social urbano. Nesta ocasião, a Gomide&Co busca apresentar uma seleção de trabalhos com o intuito de promover uma leitura sobre a sua obra a partir de pesquisas recentes que exploraram a vasta documentação em torno de sua trajetória.